segunda-feira, 4 de outubro de 2010

só mais um pouquinho


vem cá, amor. senta aqui. sabe aquele negócio de eu não querer mais? pois é, mudei de idéia, voltei atrás. eu topo seu pacto. eu lhe sirvo cego, sem emendas, intacto. do meu lado, prometo, não peço nada, podes me levar tudo, me deixar nú, de bunda pelada. pior seria se não fosse assim. chega de promessas, eu quero a vida nua e crua, com todas sua concessões alopradas, como quando seis valem mais do que meia-dúzia e doze não vale nada. quero uma rotina massacrante em que eu me pareça com todos aqueles outros que se parecem entre si. na frente da tv, quero dizer mil vezes a palavra absurdo. quero ler os livros da prateleira dos best-sellers. quero levar o nosso amor até os confins do sofrimento mais neurótico do mundo. quero não ter que inventar nada. quero me ressentir a cada minuto. quero lembrar da infância como se fosse ficção. quero me exasperar à toa quando encontrar um prato mal lavado no escorredor. quero deixar a barriga crescer, porque não vai fazer diferença. quero cagar de porta aberta, peidar enquanto você come. quero ver as crianças crescerem enquanto nosso ossos se esfarelam sob nossas peles. quero ter a certeza de que incerto só será o dia de dizer adeus. e mesmo a morte, tão insuspeita e clara, será por nós mal resolvida. o peso da dor versus o alívio da partida. por fim, aquele de nós que sobrar por último, vai passar o resto dos dias dopado, empurrado numa cadeira de rodas por uma mulher de jaleco branco que não faz parte da família. Ah, meu amor! como não desejar tudo isso do seu lado? é por isso que agora, meu amor, seremos nós dois. só nós dois caminhando de mãos dadas nesse roteiro de filme de terror. afinal, que mal há em terminar assim? então? então vamos! mas vamos depois. agora ainda é cedo, cedo demais.

Nenhum comentário:

Postar um comentário